Leia o texto a seguir para responder as questões de 1 a 6.
PRESTÍGIO EM XEQUE
A linguagem que separa as elites da norma ensinada nas
gramáticas
Por: Luiz Costa Pereira Junior Disponível em:
http://revistalingua.uol.com.br/fixos/assuntos/especiais.asp
Acesso em 22 de outubro de 2013
O país acordou com 201.032.714 de habitantes em
junho de 2013, garante o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, o IBGE.
Números tão imensos e minuciosos nascem
defasados ao primeiro bebê vindo após o seu anúncio,
mas o fato é que lembram que somos um país de cifras
continentais, que encortinam um movimento de
transformação que, na surdina, tem na língua um índice de
seu impacto.
Para linguistas, a urbanização agressiva das
últimas décadas, a TV e a mobilidade social promovida
pelo vigor econômico dos anos FHC, Lula e Dilma podem
ter ajudado a reduzir a distância entre os idiomas
expressos pela elite brasileira e pelo povão.
A ponto de haver hoje um vácuo entre a língua
efetivamente usada pela elite culta do Brasil
contemporâneo e a descrita pelas gramáticas tradicionais,
que em tese espelham o padrão culto do idioma.
Movimento
De camadas inteiras de alto poder aquisitivo e
melhor nível educacional à elite pouco culta, fechada e
hierárquica, palavras e construções sintáticas parecem
contrariar cada vez mais o repertório clássico dos
compêndios gramaticais.
Exemplos circundam as próximas páginas.
Mostram que, ao contrário de sociedades rurais e citadinas
do passado, que apresentavam pouca diferença interna
em sua gramática à custa de uma estratificação social
rígida, em sociedades urbano–industriais haveria mais
trocas simbólicas entre classes diferentes, uma variedade
mais ampla de escolhas e uma estratificação social mais
fluida, com maior linha cruzada entre repertórios
gramaticais e culturais. [...]
A urbanização intensa, no entanto, colocou em
proximidade física as diferentes classes sociais. Em 1940,
quando só 31% dos brasileiros viviam nas cidades (IBGE),
a ideia circulante era a de que o sujeito ignorante na língua
ocupava a periferia rural e os estratos sociais mais baixos;
enquanto a metrópole era o lugar das trocas linguísticas de
prestígio. Em 1980, quando esse índice chegou a 65%, o
pessoal da roça já ocupara a cidade, em décadas de
intenso contato, apesar das relações sociais ainda muito
hierarquizadas e desiguais.
Capital cultural
A urbanização e a industrialização também fizeram
com que todos passassem por fenômenos semelhantes,
em homogeneização cultural e de linguagem (o caso mais
gritante é o da harmonização de sotaques e linguagens
iniciada pela era da TV por satélite). Com isso, indivíduos e
grupos antes diferentes estão tendo mais confluência do
que se imaginava.
Em geral, a variante de linguagem menos
prestigiada é a mais criativa. A pessoa não está pautada
pela escola, a que não frequentou. Não tem a ideia de uma
tradição atrás de si. A linguagem culta tende a ser mais
conservadora, pois herdeira da tradição escolar. Muda
menos a própria língua, pois se sente mais patrulhada.
Mas, a certa altura, a classe culta tende a assimilar a
inovação de caráter mais popular, quanto mais exposta
estiver a ela em suas situações de comunicação
cotidianas.
[...] De 2003 a 2011, a renda média do brasileiro
cresceu 33%. A nossa elite ganhou um Portugal no
período: mais de 9 milhões de pessoas passaram a
integrar as classes A e B. Já uma turbinada classe C
cresceu uma Espanha, com 40 milhões de novos
postulantes a classe média.
[...] O Inaf (Indicador Nacional de Alfabetismo
Funcional) dos últimos dez anos, sistematizado pelo
Instituto Paulo Montenegro, mostra que só 25% dos
brasileiros entre 15 e 64 anos dominam a leitura e a
escrita. Eles estão espalhados em todas as classes, não
só na elite – e é de supor que, apesar dos anos escolares,
parte da elite tradicional integre os 75% da população
analfabeta funcional.